quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Opinião

SERTÃO INSURGENTE
Por Uberdan Alves

Acredito que numa época de modismos incineradores de nossa identidade cultural por meio da mídia eletrônica, o que deve mover em todos os aspectos uma pesquisa sobre o cangaço é a busca de nós mesmos nos rastos deixados por nossos antepassados, pode se dizer recente, e jamais a vaidade pessoal e egoísta de querermos ser o especialista supremo no assunto que detém as fontes de pesquisas, bibliográficas e de campo, que nenhum outro pesquisador tem.

Muito menos deve se mover pelo dogmatismo das paixões exacerbadas contra ou a favor que tende a fazer sombra à verdade dos fatos. O que não rara vezes tem-se notado em alguns pesquisadores de tema tão cheio de "veredas" contorcidas, de "quebradas" misteriosas, sem esquecer que muitos com suas pesquisas tem nos oportunizado conhecer melhor o que foi o banditismo rural e nele o cangaço em particular.

Procurar saber o que representam sociologicamente e culturalmente na história dos sertões nordestino o matuto, o vaqueiro, o capanga, o cabra, o jagunço, o cangaceiro, o pistoleiro, o fazendeiro, o coronel, o banditismo litorâneo e o banditismo rural, a entrada e participação da mulher no cangaço, e quais as inferências desses tipos humanos e desses fatos em nosso modo de sentir, agir e reagir, é mais do que prerrogativa imprescindível de estudioso do assunto, é uma necessidade que nós do sertão do São Francisco temos sentido toda vez que nos deparamos com o assunto e começamos a nos dá conta que o mito de Lampião, oralmente disseminado, tem ocultado verdades sobre ele e o cangaço, que não podem nos faltar na busca de nos compreendermos para saber quem de fato somos, e daí colhermos um valioso tributo sociocultural e histórico que nos auxilie na preservação do que é virtuoso em nossa identidade sertaneja, sem culto à personalidade, sem vaidade, sem paixões, respeitando a práxis dos fatos, para que possamos dar um tiro certeiro no discurso criminoso do rádio e da TV que nos incute estereótipos modistas comportamentais e habituais, que nada tem a ver com a gente, e possamos crescer nos reconhecendo, nos identificando, buscando eliminar os impulsos traiçoeiros, desonestos, monstruosos, sádicos, e procurando preservar as virtudes do sertão abertos às virtudes de outra regiões.

É preciso que os riquíssimos resultados das pesquisas sobre o cangaço comecem a fazer parte dos currículos de nossas escolas e universidades nas disciplinas de história, geografia, ecologia, sociologia, antropologia e em quantas mais forem cabíveis. Não devem mais ficar secretadas de intelectuais para intelectuais, sem cumprir sua missão. Basta de muito sabermos sobre a geografia, história, economia, política e cultura da Europa, E.U.A., de outras regiões do Planeta, e pouco ou quase nada sobre o sertão nordestino e nossa gente, seus movimentos sociais de resistência em uma terra "sem lei e sem rei" onde a pistola era o juiz de direito...

Por outro lado penso que do cangaço não podemos nos orgulhar nem muito menos nos envergonhar, embora saibamos que é suscetível admiração e desprezo; algumas pessoas interessadas no assunto se sentem movidas para um lado ou para o outro, ou mesmo para ambos. Certamente que se tivesse meios e alternativas, humanamente dignos, de se evitar, não só o cangaço como o banditismo rural em geral, acredito, conhecendo um pouco de tanto conviver e ser um, a índole, modo natural de ser, do homem sertanejo, sobretudo aquele de sécs. anteriores a este, genuinamente matuto, que ele os teria evitado.

Somos valentes e corajosos em todos os sentidos, mas antes somos repentistas, cantadores, emboladores, dançarinos, romanceiros, atavicamente ligados à terra, indigenamente encantados com o esplendor do sol ou da lua, religiosos, de fé inabalável, arabemente apegados a família e ao trabalho, a ponto de algumas vezes termos, sem condição, mais de uma daquelas.

Mas onde impera o afrontamento à dignidade humana, por prepotência, omissão, abandono, isolamento, corrupção, injustiça, seja pelo Estado de uma nação, seja por ações particulares, seja por ambos, cedo ou tarde o braseiro das insurreições se espalha e formas alternativas de sociedades se constituem, a exemplo de Canudos, Caldeirão, Pau-de-Colher, Contestado e Juazeiro do Norte no princípio de sua formação, e rebeldes bandoleiros sem ideologia, feito Jesuino Brilhante, Sinhô Pereira, Antonio Silvino, Lampião, Ciço Costa, Chico Pereira, José Pedro e tantos outros, surgem não por acaso.

*Uberdan Alves de Oliveira é Pres. da UBE- União Brasileira dos escritores - Petrolina. Pós-graduado em Gestão Educacional. 4 livros publicados e um no prelo: "O Furacão do Cariri".

Contato (74) 8829-2174
www.uberdanpoeta.blogspot.com

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